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Hospital da Divina Providência no séc. XX (1914-1975)

O Hospital da Divina Providência, que foi a grande obra da Santa Casa da Misericórdia de Vila Real ao longo do século XIX, teria um outro destino ao iniciar-se a nova centúria, devido à sua venda, para aí funcionar a Câmara Municipal, passando o Hospital a ocupar as instalações do Colégio de Nossa Senhora do Rosário.

O Colégio de Nossa Senhora do Rosário, para educação de rapazes, foi fundado por monsenhor doutor Jerónimo Teixeira de Figueiredo Amaral (1859-1944), da família Teixeira de Figueiredo, da Casa de Urros (Mateus), e trineto, pelo lado materno, de D. Maria Joaquina Botelho Guedes do Amaral, filha de José Botelho Correia Guedes do Amaral, morgado de Vila Cova e 2.º administrador da Colegiada de Santa Ana de Vila Real. Doutor em Direito Civil e Canónico pela Universidade de Coimbra (1882), e ordenado padre no Seminário de Viseu (1892), dedicar-se-ia à educação, facto que iria levá-lo a fundar o Colégio em finais de 1892, tendo começado a funcionar em edifício próprio, de sua propriedade, dois anos depois. Desconhecemos toda a história relacionada com a sua construção.

Sabemos, por uma notícia inserida na acta da reunião da Mesa da Santa Casa da Misericórdia, de 7 de Maio de 1901, que José Gregório Durão, mestre pedreiro, do lugar de Vila Nova, pediu que lhe concedessem autorização para colocar o material no terreno pertencente ao Hospital que ficava para o lado poente, para as obras que estava a fazer no colégio de Nossa Senhora do Rosário.

A primeira notícia relacionada com mudança de edifício aparece na acta 30 de Outubro de 1914. O provedor, Augusto Rua, que exercia também o cargo de presidente da Câmara, tomando a palavra, disse que era necessário deliberar sobre um “assunto de magna importância”, que era a aquisição do antigo Colégio de Nossa Senhora do Rosário, para nele se instalar o Hospital da Divina Providência. Esta compra, na opinião dos médicos, tinha uma enorme vantagem, não só porque o edifício era “muitíssimo maior e com acomodações altamente higiénicas”, mas também por causa da “magnífica cerca própria para a convalescença dos doentes, construção de pavilhões, etc.”.

O Villarealense, em 19 de Novembro de 1914, dava a notícia da troca dos edifícios, na qual se inseriam alguns aspectos interessantes. Escrevia o articulista que, “para que esse magnífico edifício do Hospital, depois de ser convertido em Paço Municipal, deva, logo pelo exterior, indicar o que é, para isso necessário se torna que o brasão da Misericórdia seja substituído pelo de Vila Real”, colocando-se uma lápide e a estátua “da mesma, que recordem as que havia nos arcos do antigo Fórum, e que à excepção da estátua, tudo foi sacrificado ao camartelo de Mac-Adam”.

A questão da inauguração foi referida em O Povo do Norte. Na edição de 12 de Setembro de 1915, noticia-se que a nova instalação do Hospital seria inaugurada no dia 16, com a assistência do ministro do Fomento e o director geral da Assistência Pública. Inauguração que ficou adiada, segundo O Povo do Norte de 19 de Setembro, para o dia 26 desse mês, estando nesse dia o Hospital aberto ao público, dando o mesmo jornal de 3 de Outubro a notícia “Ficou no domingo último definitivamente instalado no antigo colégio de Nossa Senhora do Rosário, o hospital civil desta vila”, realçando-se as vantagens quer higiénicas quer de comodidade que tinha o novo edifício.

Este, resultado da transformação de um colégio em hospital, vai receber, por fases, obras de melhoramento e aumento da sua estrutura inicial. Ainda em 1915 (acta de 30 de Dezembro) é apresentada à Mesa a necessidade da construção de uma casa para cozinha, já que “a actual cozinha provisória” tinha uma péssima tiragem, o que enchia o edifício de fumo, que não só deteriorava o Hospital como incomodava os doentes. A construção ficaria relativamente barata, por existirem quase todos os materiais necessários. Seriam utilizados os materiais aproveitados da demolição da “casa velha”, assim como a pedra de alvenaria que a Câmara Municipal tinha oferecido. Na mesma reunião, foi dito ser urgente a construção de um balneário, já que estava “a ser reclamado não só pelos doentes mas também pela população da vila, constituindo uma fonte de receita”.

Esta obra, e outros melhoramentos, são mencionados em O Povo do Norte de 16 de Julho de 1916, no qual se escreve que além da aquisição, adaptação e instalação dos doentes no novo Hospital, este recebeu, não só a cozinha que referimos, mas também uma moderna e completa instalação eléctrica de campainhas e iluminação em todos os compartimentos e dependências do edifício.

Os jornais de Vila Real vão-nos informando sobre o novo Hospital da Divina Providência. O Villarealense, de 4 de Maio de 1916, apresenta-o ao público, através de uma visita feita pelo articulista, acompanhado pelo dr. Augusto Rua. Com a leitura do artigo, os vila-realenses tomaram conhecimento das amplas dependências do hospital, “rasgadas ao longo de extensos corredores, banhadas de luz e ar, segundo as exigências da ciência moderna”; das salas destinadas às enfermarias, consideradas “extensas, cómodas e airosas”, iluminadas com lâmpadas eléctricas; da “inteligente disposição” das salas de operações, rouparia, secção de aparelhos cirúrgicos, banco, receituário, etc.; dos quartos para os pensionistas, para homens e mulheres, de mobiliário simples mas perfeito para o sítio a que se destina; e da envolvência do Hospital, onde se construía na altura a cozinha, e onde existia um terreno para cultivo, além de um “jardinzinho com elegante taça”. Finalmente, o artigo chamava a atenção para “a igreja do Hospital [capela de Santa Ana] ricamente posta, com os túmulos dos generosos e nunca esquecidos Freitas”. Ao longo de toda esta entusiasmada descrição no artigo, só se lamentava não existir uma casa para banhos, devido à importância que os médicos davam à balneoterapia.

Com a compra do Colégio de Nossa Senhora do Rosário, ficou a pertencer ao Hospital da Divina Providência a Casa dos Morgados de Vila Cova e a capela anexa da invocação de Santa Ana, que devido à sua ligação com o colégio ficou a ser conhecida por Capela de Nossa Senhora do Rosário, levando ao esquecimento da sua primeira invocação.

A Casa dos Morgados de Vila Cova, que Augusto Soares de Azevedo Barbosa de Pinho Leal informa ser uma casa brasonada com uma torre, à qual se ligou, mais tarde, a Capela de Santa Ana, seria demolida em 1916, para a construção de um novo corpo do Hospital da Divina Providência da Misericórdia de Vila Real, sendo poupada, na demolição, a capela.

Numa imagem antiga do Hospital, vê-se aquilo que deveria ser a estrutura do Colégio de Nossa Senhora do Rosário. Um edifício formado por dois corpos, dispostos em L, constituídos por três pisos rasgados por janelas, sendo o superior de tipologia de mansarda, ao que os franceses denominam étage de comble. O corpo recuado, na sua parede norte, era rematado pela Casa dos Morgados de Vila Cova e pela Capela de Santa Ana. Demolida a antiga residência dos Morgados de Vila Cova, esta daria lugar a um novo corpo, que formará com a estrutura do colégio um edifício de planta em U com uma fachada nobre.

Em 25 de Novembro de 1928, foi considerado necessário construir-se uma casa mortuária em condições, para depósito dos cadáveres de doentes falecidos no Hospital, tendo-se aventado a ideia do aproveitamento do material da casa que ia ser demolida, para se proceder à sua construção no terreno que limitava com a rua Jerónimo Amaral, junto à base da torre da capela do edifício.

O novo corpo tem uma elegante fachada virada a Norte, com dois pisos e três secções, sendo a central mais avançada em relação às duas laterais, ficando a do lado poente paredes meias com a capela de Santa Ana, ocupando esta fachada o espaço onde existia a Casa dos Morgados de Vila Cova. No rés-do-chão apresenta nove vãos, três portas no corpo central de arcos plenos e três janelas (de lintel curvo) em cada uma das secções laterais, repetindo-se o esquema, através de janelas de sacada (de lintel curvo) no piso superior. As três secções da fachada são enquadradas por colunas sobrepostas dóricas e coríntias, rematadas por urnas sobre acrotérios A secção central é rematado com um frontão com tímpano decorado com escudo e as laterais por parapeitos lisos.

A proveniência dos materiais desta fachada, de acentuado classicismo, é referida numa noticia publicada no jornal O Villarealense, de 14 de Dezembro de 1916, na qual se escreve que “devido ao cumprimento do legado de António Gonçalves Folhadela iria ser construída uma enfermaria para entrevados, aproveitando-se para isso a fachada dos antigos Paços do Concelho e que ultimamente dava ingresso no Salão High-life, actualmente em demolição”, assunto sobre o qual ainda se fala em 1917.

A fachada lateral do novo corpo apresenta nos dois pisos seis vãos, três janelas de peitoril e superiormente duas de peitoril enquadrando uma janela de sacada (no projecto tinha uma porta no piso inferior ladeada por duas janelas de peitoril). A fachada posterior, segundo o projecto, tinha no piso inferior uma porta ladeada por duas janelas de peitoril de cada lado (hoje tem duas portas laterais que ladeiam três janelas de peitoril) e no andar superior cinco janelas de peitoril, que ainda mantém. Tanto do lado da rua como do actual pátio de entrada este corpo é rematado por uma mansarda.

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